sexta-feira, 23 de outubro de 2009

"Caim" - novo livro de José Saramago




O caderno Prosa & Verso, do jornal O Globo, deste sábado trazia os comentários sobre o novo livro de Saramago, “Caim”- aquele do mais famoso fratricídio da humanidade. Juan Arias escreve o artigo. Ele que é, inclusive, autor de um livro sobre o Nobel português – “José Saramago – o amor possível” -, além de “A Bíblia e seus segredos” e “Jesus, esse grande desconhecido”.

Comenta Arias que “mais do que a história romanceada de Caim, o escritor aborda em seu livro o absurdo de um deus – sempre registrado com minúscula, por Saramago – que na Bíblia aparece mais cruel e caprichoso que o pior dos homens.”
Ainda segundo Arias, “em todo o texto, no qual Caim é protagonista e narrador das atrocidades do deus bíblico, o irmão de Abel não nega seu crime e aceita sua vida errante como uma espécie de castigo. Não aceita, contudo, ser mais criminoso e cruel que deus. Se ele matou seu irmão – segundo Saramago, na realidade, ele queria matar deus – esse deus cometeu muito mais crimes que ele... A dialética de Caim com deus é impecável: se eu pequei, tu pecaste mais. Se eu matei meu irmão, tu mataste, ou mandaste matar a muitos mais”.
O último parágrafo da análise de Arias é bastante interessante. Escreve ele: “Para Saramago, deus não é mais que um pretexto para que as religiões possam melhor escravizar a consciência humana. Com ‘Caim’, ele trata de deitar, literariamente, sobre o tapete do mundo, esta crua realidade. Ao mesmo tempo, e apesar do seu ateísmo, devemos a ele uma das definições mais poéticas da divindade: ‘Deus é o silêncio do universo, e o homem o grito que dá sentido a esse silêncio’, afirmou ele em certa ocasião. Afinal, deus não é para ele tão indiferente como possa parecer. ‘Caim’, definitivamente, é também um grito contra todos os deuses falsos e ditadores criados para amordaçar o homem, impedindo-o de viver, em total liberdade, sua vida e seu destino”.
Ao lado do artigo sobre o livro, há uma pequena entrevista com o próprio Saramago. Gostaria de citar três das questões feitas, bem como as fortes respostas.
JORNAL: “O Caim que o senhor constrói é a voz da razão, da clareza de raciocínio, mostrando um Deus tão tirano e incompreensível que torna qualquer crença patética. Qual sua intenção ao escrever o livro?”
SARAMAGO: “No fundo, o problema não é um Deus que não existe, mas a religião que o proclama. Denuncio as religiões, todas as religiões, por nocivas à Humanidade. São palavras duras, mas tenho que dizê-las”
JORNAL: “Outros ateus convictos, como Richard Dawkins e Christopher Hitchens vêm dedicando seu tempo a uma cruzada antirreligiosa. Como vê esse movimento?”
SARAMAGO: “Por mim, não o faria. É praticamente impossível convencer alguém a virar as costas às suas crenças. Limito-me a escrever o que penso do assunto e deixo aos leitores a inteira liberdade de fazer o que entendam. O único que peço para mim é respeito”
JORNAL: “O senhor acredita que ainda é possível a existência de um mundo sem religião? O pessimismo de Caim em relação à Humanidade é também o seu?”
SARAMAGO: “Penso que não merecemos a vida, penso que as religiões foram e continuam a ser instrumentos de domínio e morte. Em suma, Caim teve razão para tentar impedir que outra humanidade substituísse a que teria morrido no dilúvio. Afinal, se a primeira era má, esta é péssima...”

 Entrevista retirada do blog do Ricardo - Spinoza e amigos.




Agora algumas considerações sobre as perguntas. Enquanto Saramago, como bom membro do Partido Comunista, diz que todas as religiões são nocivas à humanidade, eu partilho o ponto de vista de Michel Onfray e restrinjo o caráter nocivo apenas às religiões do eixo judaico-cristão por todos os motivos que vocês, caros leitores, ja devem estar carecas de saber: poder, manipulação, ilusão,distorção, oportunismo de inocências etc. Em relação à última resposta de Saramago, a de que não merecemos a vida, tenho duas objeções. A primeira é sobre a relevância da afirmação, penso ser irrelevante se merecemos ou não a vida, o fato é que a temos e, uma vez nesta condição, temos que fazer o melhor possível dela, com o que temos em mãos. A segunda é em relação às implicações: a afirmação de que não merecemos a vida me soa um tanto quanto metafísica. Falar em merecimento da vida automaticamente me traz a noção de alguma coisa que nos foi dada, neste caso, a vida só pode ter sido dada se admitirmos a existência de um ser superior, responsável pela vida, que nos deu algo que não merecemos. Caso não exista deus algum, a vida que temos não pode ser medida em termos de merecimento. Não sei se me fiz claro.

De qualquer modo, coloco o livro na minha lista de "a serem lidos" e prometo colocar minhas impressões aqui.


quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Comentários sobre o filme "V de Vingança"



“V de Vingança” (V for Vendetta) foi lançado em 2005 nos Estados Unidos e possui como roteiristas Andy Wachowski e Larry Wachowski, os mesmos de Matrix. O roteiro é inspirado na série em quadrinhos homônima de Alan Moore. A direção é de James McTeigue que já trabalhou como assistente de direção ou segundo diretor em vários projetos como na própria trilogia Matrix e também em Guerra nas Estrelas (Ataque dos Clones).

O tema gira em torno de vingança e medo. O primeiro constitui o corpo da obra e o segundo, a alma. E é por ter alma que este filme possui qualidade. Alguns podem não gostar dele mas classificá-lo como ruim é atestar a falta de qualquer conhecimento sobre cinema e artes em geral.

O que faz pinturas de Da Vinci, Michelangelo, Salvador Dalí e outros serem diferentes é justamente por terem alma. Ao criá-las esses artistas colocavam nas telas amor, paixão, ódio, imprimiam seus sentimentos e visões de mundo carregados de significados. Além disso, cada obra era única. Só existe uma única “Mona Lisa”, uma única Capela Sistina, um único “Dom Quixote”.

Nos dias atuais, este conceito de arte ainda persiste mas não é mais a corrente dominante. A lei mandatária da nossa era é a “linha de montagem”, a institucionalização, os padrões, as fórmulas e equações que garantem o retorno necessário para o pagamento das contas e que sustentam os lucros.

É muito comum nos shopping centers a presença de pequenas galerias para venda de quadros. Até parece ser mais um milagre dos tempos modernos - o acesso das massas a arte. Uma grande contribuição do nosso tempo a humanidade? Conversa fiada! Se analisarmos com mais cuidado podemos constatar que se trata de uma imagem chapada, impressa em papel sintético, por uma máquina e através de uma matriz. Como máquinas não possuem sentimentos, eu encaro esse objeto como uma farsa, uma obra sem alma.

Algo parecido acontece também no cinema. Hollywood é o mais claro exemplo de institucionalização da arte. O objetivo dos produtores incluem as contas pagas e o lucro garantido. Pra isso existem os clichês e os chavões hollydianos tais como Mel Gibson e Julia Roberts que garantem a bilheteria. Além disso, a tecnologia também dá uma mãozinha. Há inúmero programas de computadores que até mesmo criam os personagens, permitem cruzar perfis, situações, etc. Trata-se mesmo de algo tal como um linha de montagem que no fim tem-se um produto que será consumido por milhões de pessoas pelo mundo todo. Um produto que muitas vezes não tem alma, ou seja, é simplesmente o resultado de uma fórmula de gerar lucros.

Não é esse o caso de “V de Vingança”. Ele não é simplesmente um produto sem vida, sem significados. Sua história até possui clichês que poderiam levá-lo ao desastre, poderia torná-lo um blefe. Seria fácil escorregar para uma critica ou para uma denúncia como simples artifício para atrair o público. Isso seria muito hipócrita por condenar uma certa situação ao mesmo tempo que se aproveita dela.

A história se ambienta em um momento futuro em que a Inglaterra passa por um regime extremamente autoritário. Um político jovem, promissor e extremamente religioso é membro do partido Conservador, é decidido e não tem consideração nenhuma pelo processo político. Seu partido lança um projeto em nome da segurança nacional para a busca de armas biológicas. No entanto este objetivo é apenas fachada pois com isso não seriam questionados sobre os custos. O verdadeiro sentido do projeto é o poder. Dominação completa e total.

Foi criado então o Centro de Detenção Larkhill (Larkhill Detention Center) onde pessoas eram aprisionadas e submetidas a inúmeras violências e até mesmo serviam como cobaias para a criação de um vírus letal ao mesmo tempo que providenciavam também o medicamento para a cura que ele causaria.

Incentivado pela mídia, o medo de uma gerra biológica se espalha rápido e o partido Conservador é visto como a única saída para detê-la. Ele é então eleito e alcança o poder que tanto almejava.

Já com o vírus em mãos, era o momento de o partido mostrar serviço. Ele foi usado em uma escola, no metrô e numa estação de tratamento de água. Centenas de pessoas morreram nas primeiras semanas. Após a contaminação, uma fábrica de remédios controlada por membros do partido lança no mercado o Viadoxic, um medicamento que neutralizava o vírus. A empresa passou a bater recordes nas bolsas de valores e o povo acreditava ser um milagre de Deus que a teria escolhido para salvar o país.

Alguns extremista oposicionistas, usados como bodes expiatórios, foram julgados e condenados, e um memorial é erguido para canonizar as vítimas.

No entanto, os patifes do governo não contavam que um homem que estava preso em Larkhill tinha sobrevivido. Este assume o codinome “V” e dá início a um trama cuja base é a vingança. Ele “visa varrer esses vermes venais e virulentos da vanguarda do vício que permitem a viciosa e voraz violação da vontade”.

Se o filme tivesse ficado nisso eu mesmo teria-o condenado ao inferno para que queimasse ali junto com Rambo e outros do gênero. Mas Alan Moore deu alma a história e os irmãos Wachowski souberam bem traduzi-la para o telão.

Reflexões sobre o medo

O medo tornou-se a ferramenta fundamental do governo para instaurar um sistema de crueldade, injustiça, intolerância e opressão. As redes de televisão BTN (British Television Network) e Interlink contribuem muito divulgando notícias maquiadas.

As pessoas são fracas, não levam em conta que podem ajudar seu país se agissem de um modo diferente. Mas esta consciência é muito difícil de ser adquirida pois o medo é uma emoção, uma condição natural que provoca em nós a percepção do valor negativo que uma determinada situação tem para as nossas necessidades e interesses. Trata-se de um índice que indica o valor não desejável que uma situação tem para a nossa existência, ou seja, para a nossa vida.

Aristóteles afirma que “o medo é uma dor ou uma agitação produzida pela perspectiva de um mal futuro, que seja capaz de produzir morte ou dor”. Isso implica que nem todos os males são temidos mas apenas aqueles que provocam dor e destruição e também que sejam iminentes. Todos sabemos que vamos morrer um dia mas apenas somos tomados pelo medo quando encaramos a morte frente a frente.

Em “V de Vingança”, mesmo o governo usando da violência em vez do diálogo, eliminando a liberdade de se opor, pensar e falar, a população se via obrigada a se submeter. O chanceler criou uma determinada ordem de coisas que mostrava que a segurança da nação somente seria possível através da total submissão das pessoas as suas determinações. Ele tornou a possibilidade de um ataque com armas biológicas algo iminente e muito próxima da realidade das pessoas.

Hobbes afirma que emoções, como o medo, controlam toda a conduta do homem e, neste mesmo sentido, Descartes afirma que a função natural das emoções é nos incitar a executar ações que servem para conservar o corpo ou para torná-lo mais perfeito. Descartes ainda considera que as emoções não provém da diferença entre os objetos, mas dos diferentes modos pelos quais os objetos nos prejudicam, nos ajudam ou, em geral, têm importância para nós. Kant complementa que as emoções ajudam e sustentam a existência implicando que a utilidade das emoções decorre da função exercida em face da vida.

Heidegger é quem aproxima o tema da angústia a grande discussão sobre o medo. Para este pensador, diferentemente do medo, que sempre existe em relação a algo que está dentro do mundo, que se aproxima ameaçadoramente e que pode ser removido, a angústia só pode ser sentida diante do mundo como tal. Ela não é provocada como ocorre com o medo, por um fato particular, mas apenas é contingente da nossa existência.

Com base nesta premissa, o médico e fisiológico Kurt Goldstein demonstrou que a adaptação de qualquer organismo a um ambiente acontece através do que ele chamou de “reações de catástrofe”. Após vários choques, os eventos catastróficos passam ter um significado de comportamento ao organismo, ou seja, ganham forma emotiva de angústia, que o dará capacidade de agir para conservar sua existência. O que produz o medo é o sentimento de possibilidade de surgimento da angústia.

E é justamente essa fraqueza natural que todos temos que é usada pelo governo inglês criando uma série de problemas para que juntos tenham a função de corromper a razão e afetar o bom senso das pessoas, tornando-as angustiadas por uma ameaça sempre presente, sempre muito próxima, pronta a se concretizar a qualquer momento. O medo então as dominam e as fazem recorrer ao novo alto chanceler Adam Sutler que promete paz e ordem pedindo em troca um consentimento silencioso.

Mas o filme não pára por aí em suas indagações sobre a natureza humana. V inspirou-se em um personagem histórico, um soldado chamado Guy Fawkes. Este fazia parte de um grupo que articulou um plano, chamado de “Conspiração da Pólvora”. Ele fora pego no dia 5 de novembro de 1605 acertando a posição de 36 barris de pólvora no porão do prédio do parlamento inglês. Seu objetivo era fazer voar pelos ares o prédio do Parlamento com praticamente todo o governo britânico de então: o rei, a nobreza e os parlamentares. Até hoje, todos os anos no dia 5 de novembro, pessoas no Reino Unido, Nova Zelândia, África do Sul, Terra Nova e Labrador e São Cristóvão celebram a falha da conspiração, na chamada Noite de Guy Fawkes.

A vingança de V então consiste em fazer o que Fawkes não conseguiu, isto é, destruir o prédio do Parlamento com Big Ben e tudo o mais que ele tem direito. Ele quer, com isso, fazer com que imparcialidade, justiça, liberdade sejam mais que palavras vazias de discurso político, mas sim perspectivas que guiam ações efetivas, palavras recheadas de substância, que oferecem um significado e, para aqueles que ouvem, a enunciação da verdade.

Para V a explosão do prédio significa o mesmo que o prédio em si, ou seja, um símbolo. Através deste ato, o povo se liberta do medo, deixando de precisar de signos, e passa a ter esperança sustentada por uma consciência mais precisa da realidade.

Este desenrolar de acontecimentos é bastante interessante. É Sheler quem aponta a relação entre objeto e medo como uma relação simbólica pois considera que os estados emotivos não têm caráter intencional por si mesmos. Não se referem imediatamente a objetos ou situações. O estado emotivo pode tornar-se um signo do objeto ou da situação. Para Sheler, o valor constitui o objeto próprio da emoção e é considerado uma realidade específica, irredutível às realidades percebidas ou conhecidas de natureza absoluta.

Portanto, como bem afirma V, a explosão de um prédio pode sim mudar o mundo embora não existam certezas de nada mas apenas oportunidades. A oportunidade para V está clara, e é com este ato que ele pretende mudar radicalmente a mente de seus concidadãos, colocando abaixo símbolos, signos, significações que tiram a atenção da população não permitindo-as pensar e agir de forma autônoma.

Max Weber também acreditava que as ações são realizadas a partir de motivações que, de certa forma, oferecem significado ou sentido próprio à conduta humana. A sociedade retratada em “V de Vingança” está presa a uma realidade forjada, a uma significação criada e imposta por um grupo que visava o poder. Essa situação somente será alterada se todas as pessoas, coletivamente, mudarem a forma como enxergam as coisas, algo que é muito, mas muito difícil. Somente um evento muito marcante, de grandes proporções, para provocar uma ruptura de paradigma de tal magnitude.

No dia 11 de setembro, os aviões foram além de atingir duas torres e matar milhares de pessoas. Os arquitetos desta ação conseguiram com isso abalar uma crença já muito enraizada. Os estadunidenses possuem fascinação por edifícios. Os prédios são símbolos de progresso e poderio econômico. Dessa forma, foi destruído também a convicção inabalável de invulnerabilidade.

Considerações finais

Eu vejo “V de Vingança” como uma caricatura da realidade. Todos nós sabemos que os caricaturistas supervalorizam aspectos singulares fazendo-os se sobressaírem exageradamente no todo.

Contudo, talvez a trama apresentada no filme seja uma representação exagerada de outras formas de dominação das quais estamos submetidos sem perceber. O filme nos chama a atenção pra isso e também que esforços, muitas vezes dolorosos, sejam necessários para se libertar de qualquer estado de opressão.

Qualquer forma de controle é uma agressão a nossa capacidade criativa e inventiva.
Retirado do blog de meu colega Cristiano de Jesus


Até a próxima!
Ao som de - Be Agressive - Faith no More

sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Ateu encontra prova de inexistência de Deus

Ateus, céticos, agnósticos, pseudo-céticos, crentes. A antiga luta ateu x crente que levanta calorosos debates e risadas ainda se movimenta. A questão de acreditar ou não em algo superior é tão séria que qualquer pessoa, em alguma fase de sua vida buscará seu posicionamento e suas justificativas sobre o que e como crer (ou não).

Vou deixar de lado, neste post, os argumentos utilizados por cada lado e suas falhas a acertos. Me lembro aqui, de uma senhora insuportavelmente chata que me pegou no ônibus, querendo me converter e não acreditava que eu não acredito em nada.

Por hora, deixo alguns conceitos que podem ajudar alguém a se esclarecer

Teísta: Usado aqui como todo aquele que crê em alguma deus, seja ele qual for. Vejam bem, independente de qual religião o indivíduo segue. É um dogmático pois afirma uma verdade que não pode ser contestada. Se inserem aqui qualquer pessoa que segue alguma religião, que não segue mas acredita em deus ou em uma forma superior de inteligência.

Ateu: É quem nega que haja deus ou alguma realidade que se possa chamar de divina. Também é um dogmático pois afirma uma verdade que tende a ser definitiva. Porém, este é um dogmático "negativo": enquanto o teísta afirma que, o ateu afirma que não há. A maioria das pessoas que duvida da existência de deus se auto intitula ateu (erroneamente).

Cético: Os céticos se opõem ao conhecimento seguro. Duvidam da capacidade humana de afirmar qualquer coisa com certeza apodíctica, incluindo aí a existência de uma inteligência superior (e incluindo aí a própria certeza desta afirmação, o que geraria, para alguns, o paradoxo cético).  A palavra deriva do verbo grego sképtomai que significa algo como "olhar cuidadosamente", "vigiar", "examinar atentamente". Logo, o cético seria "aquele que olha cuidadosamente" na sua busca pela verdade, antes de pronunciar-se sobre algo, antes de tomar alguma decisão. O fundamento da atitude cética é a cautela, o cuidado e a examinação.

Agnóstico:  significa, literalmente, "aquele que não sabe". Agnosticismo é a postura daquele que "não sabe" ou "não pretende saber". O termo original foi usado para se opor àquelas doutrinas segundo a qual é possível conhecer mais coisas que a ciência permite. O agnóstico nega a possibilidade de conhecermos deus, diz que não temos métodos para conhecê-lo de modo válido.


Definidos em relação aos posicionamentos, vamos a um vídeo que achei muito interessante. O mais curioso é a ironia em perceber como os ateus, no vídeo, se apropriam de argumentos dos teístas e os teístas, para negar o absurdo, se apropriam dos argumentos ateus.





 Terminado o vídeo, alguns esclarecimentos sobre ceticismo.
 
Deve-se atentar para as peculiaridades do ceticismo teórico e prático. Do ponto de vista teórico, o ceticismo é uma doutrina do conhecimento segundo a qual não há nenhum saber firme ou opinião segura. Do ponto de vista prático, consiste em uma atitude de não aderir a qualquer opinião, na suspensão dos juízos (a chamada epoké), em busca da paz interior. Imediatamente podem estar passando pelas cabeças pensantes de vocês a problemática que o ceticismo gera no que concerne ao agir: se não posso afirmar nada com certeza e se tenho que suspender meus juízos todos, o que devo escolher, isto é, como devo agir, viver? Pois é, como? Deixo-os pensando um pouco sobre isso.
Até o próximo!!

Ao som de: Depeche Mode - Personal Jesus

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Felicidade e trabalho



Hoje vou postar algo sobre um autor contemporâneo que eu gosto bastante. Alain de Botton, autor de "Arquitetura da felicidade", "Consolações da filosofia" entre outros. Todos destinados a amplo público e com uma linguagem acessível.

Em seu mais novo trabalho, "Os prazeres e desprazeres do trabalho", Alain afirma que desprazeres e desilusões são inevitáveis no trabalho e que a busca incessante por realização plena aumenta a sensação de infelicidade constante. Faz muito sentido em um mundo em que realização passou a ser "ter" algo, produzir algo. E a busca incessante pela imortalidade, por deixar uma marca neste mundo que seja inesquecível por gerações, continua. Esse medo do vazio assombra...

Reproduzo aqui uma entrevista com Alain publicada na Folha de hoje.

FOLHA - Que importância tem o dinheiro na felicidade no trabalho?
ALAIN DE BOTTON
- Dinheiro é uma forma de amor. Não adianta alguém dizer "gosto muito de você". Apenas quando você ouve "ok, vou lhe pagar 1 milhão de libras" você sente que é necessário. É difícil compreender que você é importante quando é mal pago, mesmo se disserem que você é ótimo.
FOLHA - Felicidade e trabalho podem conviver?
DE BOTTON
- A pergunta é se amor e trabalho podem estar juntos. Minha resposta é: sim, na teoria. Existem pessoas que são felizes no emprego, mas são uma minoria. Não há razão, em tese, para que você seja infeliz no trabalho, mas há várias, na prática, para que a vida no escritório seja difícil. Se o cara que senta ao seu lado é um idiota, você vai odiar o trabalho, por melhor que ele seja. É impossível passar pela vida profissional sem pelo menos uma série de insatisfações, questionamentos e crises.
FOLHA - Desde o começo de 2008, 23 funcionários da France Telecon (empresa de telefonia francesa) se suicidaram. O que pensa disso?
DE BOTTON
- O capitalismo moderno sugere que os seres humanos são apenas commodities, mercadorias que se pega e pelas quais se paga um preço. Mas há uma grande diferença entre pessoas e algodão ou petróleo. As pessoas podem cometer suicídio. Você contrata uma pessoa inteira, não apenas um cérebro ou um braço. Isso precisa ser reconhecido pelos capitalistas.


Ao som de: It Could be Sweet - Portishead

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Salve geral

Maio de 2006, dia das mães. Uma organização criminosa arma um esquema complexo para parar São Paulo. E conseguem. 293 ataques, 41 policiais e agentes de segurança assassinados, 54 feridos, 82 ônibus queimados, entre outros. Um fato inesquecível para a cidade de São Paulo, sobretudo àqueles que têm família na Polícia Militar.

Outubro de 2009. Sérgio rezende (Zuzu Angel, 2 filhos de Francisco - roteiro), lançará um longa metragem baseado nos fatos de 2006. O filme, que pode ser o concorrente brasileiro ao Oscar por melhor produção estrangeira, conta a história de uma mãe disposta a percorrer a fina linha de seus valores éticos (ética como mãe? Ética como cidadã?) para salvar seu filho,Rafael, 18 anos, preso.

Vejam o trailer:




Me lembro que aproveitei os acontecimentos da época para questionar o alcance e efetividade do Estado. Ficou muito claro que, onde o Estado não chega, logo surgem novos poderes paralelos. É um movimento natural que advém das relações de micropoder sociais. O Estado não garantia os direitos dos presos e marginalizados, logo surgiu uma nova figura com pretensão à soberania para ocupar o vácuo criado. Ilegítimo, porém aceito socialmente.

E o filme vale para questionamentos éticos. A mãe que quer salvar seu filho está disposta a cruzar a lei para conseguir seu fim último. Aqui fica a questão: que papel esta(s) mulher(es) devem seguir - e portanto, que conduta tomar? O papel de mãe querendo proteger os seus ou o papel de uma cidadã a cumprir com seus deveres sociais e cívicos num Estado ausente? A espera pelo filme é grande.

E quem comparar com Tropa de Elite perde o dedão da mão direita. Depois do Capitão Nascimento, qualquer filme nacional com tiro é cópia da obra de José Padilha.

Abraços!

Questões morais

Baseado no texto anterior, levanto aqui algumas reflexões acerca da moral e da natureza de nosso sentido de moral:

  • Na história da evolução das espécies, qual o papel da moral e sua importância na preservação da espécie humana?
  • Há propriedades universais para nossas valorações morais, fazendo assim sentido falarmos em uma "gramática moral"? (Algo parecido com o que Noam Chomsky afirma sobre a gramática)
  • Quais são as causas de nossas variações morais culturais?
  • Até que ponto nosso senso moral depende do domínio de ponderações específicas e imediatas?
  • Que limitações ocorrem na criança ao esta adquirir a capacidade moral?
  • Os psicopatas possuem um déficit na moral ou déficit em unir conhecimento moral com os comportamentos moralmente apropriados?

Questões retiradas do site de Harvard, do departamento de Damásio.

O Erro de Descartes

Ooolá, vamos a mais um livro, desta vez indico "O erro de Descartes" de Antônio Damásio, neurologista português, atualmente professor em Harvard. Aos meus alunos que já estudaram Descartes, fica a questão: qual foi o erro de Descartes?







Penso, logo existo. Esta afirmação, talvez a mais famosa da história da filosofia, ilustra exatamente o oposto do que o autor deste livro propõe e desenvolve em suas páginas. A frase de Descartes sugere que pensar e ter consciência de pensar definem o ser humano. E como sabemos que o filósofo francês concebia o ato de pensar como uma atividade separada do corpo, sua definição estabelece um abismo entre mente e corpo. Para contestar Descartes - e todas as consequências dualistas de sua afirmação - Antônio Damásio não recorre a filigranas escolásticas ou sutilezas metafísicas, mas ao seu conhecimento de pacientes neurológicos afetados por danos cerebrais.

Tais estudos abrem as portas para a investigação de um campo quase inexplorado pela ciência: as relações entre razão e sentimento, emoções e comportamento social. Na visão de Damásio, sentimentos e emoções são uma percepção direta de nossos estados corporais e constituem um elo essencial entre o corpo e a consciência. Em suma, uma pessoa incapaz de sentir pode até ter o conhecimento racional de alguma coisa, mas será incapaz de tomar decisões com base nessa racionalidade.

Ao tirar o espírito de seu pedestal e colocá-lo dentro de um organismo que possui cérebro e corpo totalmente integrados, o autor sublinha a complexidade, a finitude e a singularidade que caracterizam o ser humano. Reconhecer a origem humilde e a vulnerabilidade do espírito e, ao mesmo tempo, continuar a recorrer à sua orientação é tarefa difícil, mas indispensável. o ponto de partida da ciência e da filosofia deve ser anticartesiano: existo (e sinto), logo penso.

Texto retirado da orelha do livro.

E então, curiosos leitores, encontraram o erro de Descartes? Onde fica o racionalismo, a independência do funcionamento racional, de nossa res cogitans, sem nosso corpo, a res extensa (como dizia o professor de física baiano) como regulador e nosso cérebro funcionando em todas as suas estruturas?

Indico enfaticamente a leitura deste livro para que se possa compreender um campo de trabalho recente na filosofia e na neurologia, que acabam refletindo na psicologia: a distinção corpo/mente, uma possível estrutura cerebral fixa que nos leva aos sentimentos, o sentimento como ferramenta evolutiva. Nesse caso é curioso tratar como ferramenta para a sobrevivência aquilo que sempre tratamos como o de mais sublime que existe no humano: os sentimentos.

Ao som de: Unnatural Selection - Muse

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Hey Jude e o encanto

Olá,
esse é um blog de filosofia, com conteúdo filosófico e semelhantes. Exatamente por isso não pude deixar de dividir este vídeo com vocês, leitores. Filosofia trata de encanto. O próprio ato de pensar se inicia com o espanto para com o mundo que gera os questionamentos. Aí a filosofia é imais do que entendida, é incorporada à nossa vida como uma atitude, uma postura para olhar o mundo, algo muito além de uma disciplina curricular, que 50 minutos semanais não ensinam nem a pau. Mas ainda resta a chance de mostrar o encanto, de des-velar uma presença que está velada, afogada e deturpada na de-cadência do homem de hoje.
Aí que entra esse vídeo que me arrepiou até a palma da mão. Uma mensagem no seu celular, de sua operadora :"Esteja na Trafalgar Square, dia 30/04 as 6pm". As 13.500 pessoas reunidas não faziam ideia do que se desenrolaria no lugar. Cada uma recebe um microfone e a beleza se mostra:

E uma tremenda ação de marketing, diga-se de passagem. Mas belo o bastante para pensarmos sobre as pausas necessárias na correria do cotidiano e sobre a real necessidade de fazer tudo o que fazemos.
"O Ser se revela àquele que escuta" Heidegger

domingo, 13 de setembro de 2009

Mamonas assassinas e a filosofia

 Retirado do blog Filosofia e vida do Prof. Francisco de Santo André!
Obrigado pela dica colega!


Olá a todos!
Obrigado pelas visitas recentes! Comentem mais.
Para aprendermos um pouco sobre características da filosofia, vamos voltar no tempo e cantar Mamonas Assassinas, aqueles que faziam eu rachar o bico todo domingo no Faustão e cantar letras que eu não tinha muita noção do significado.

Original: Sábado de sol / Mamonas Assassinas

Filosofia busca
fundamentação.
Da realidade
quer compreensão.

É rigorosa,
na reflexão.
Abre nossos olhos,
contra alienação.

Sócrates, Platão
Nietzsche e o tal Zenão,
são filósofos
que fugiram da prisão.

De qual? do quê?
Da falta de noção.
Para onde foram?
Usar a razão!!!
Música:Professor Ricardo M. / Blumenau
Ao som de: Mamonas Assassinas - Sábado de sol

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Definição de Filosofia

Sempre, ao final de minhas aulas, me perguntam "o que faz um filósofo?" "Há campo de trabalho para um filósofo?". Na próxima vez vou responder dando um cartão com o presente link.
A imagem:
Bem que eu poderia ser aquele filósofo clássico cujo melhor amigo era o ócio. Aristocrata com orgulho.
Ao som de: Sinal da última aula de sexta feira a noite - E.E. Major Alvim

Filosofia em quadrinhos

Quadrinhos do tipo Sandman, V de Vingança ou Watchmen são conhecidos e famosos por -além de seus méritos artísticos- propiciarem reflexões dignas em formas alternativas de linguagens que não as linhas de um livro. Agora estes encontram companhia nas prateleiras pensantes. Uma coleção de quadrinhos lançada há pouco tempo leva obras como "O Príncipe" de Maquiavel para os quadrinhos. Também farão parte desta coleção: "A Utopia" de Tomas Moore, "Cândido" de Voltaire, "Elogio da loucura" de Rotterdam e outros 6 volumes relacionados a acontecimentos históricos.


O que pode fazer torcer o nariz de alguns conservadores preocupados com a banalização e simplificação da filosofia é um poderoso recurso didático e de divulgação filosófica.


O interessante e inusitado em passar filosofia em forma de quadrinhos é que é uma linguagem diversificada que é muito mais direta em passar emoções e dramaticidades não presentes nas obras originais, atraindo assim, leitores que não estariam dispostos a uma leitura densa e complicada das obras no original. 
Essa nova emoção gerada pelas HQs deve servir apenas como uma fonte de pesquisa que não se esgota nesta leitura. Toda adaptação é um corte e a transposição do livro para a HQ também limita a beleza do texto original e seu desenrolar lógico. Mas pode servir como uma porta a um novo mundo, um incentivo à leituras originais e diferenciadas. Assim como o leitor de Machado hoje é o leitor de Cebolinha há 10 anos. Agora os nerds não têm mais desculpa!!









Imagem de "Maquiavel", já disponível em versão quadrinhos.

Ao som de: Dog Fashion Disco - Leper Friend

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Cine filô





 





Hoje começo a postar sobre materiais filosóficos: livros, filmes, grandes obras e eventos. A ideia é divulgar o pensamento filosófico e mostrar que a filosofia ainda é viva e contemporânea; Disseminar informação e cultura filosófica.

De início, uma entrevista realizada com Ollivier Pourriol, autor do livro "Cine Filô".
Acreditando piamente que a sala escura do cinema permite a rara fusão entre imaginação e racionalidade, o francês Ollivier Pourriol teve uma idéia inusitada: ensinar filosofia através de enredos de filmes cultuados no mundo inteiro. Que tal aprendercom Brad Pitt, Tom Cruise, Bruce Willis e Christopher Lambert? O Clube da Luta, por exemplo, leva a um saboroso debate sobre a liberdade; Colateral é pretexto para salientar noções de método; O sexto sentido remete às fronteiras entre consciência e percepção. Assim, por meio de personagens da cultura pop, com seus dilemas contemporâneos, questões tradicionalmente consideradas “difíceis” chegam até o leitor leigo de forma compreensível, envolvente e sem banalizações. A filosofia se torna finalmente um conhecimento ao alcance de todos.

Como foi sua trajetória profissional?
Liceu Louis-le-Grand, em Paris, depois École Normale Supérieure (rua d’Ulm). Licenciatura em filosofia. Mestrado e doutorado em filosofia (Sorbonne-Paris IV) sobre a filosofia de Alain.
Como surgiu a idéia de ensinar filosofia com a ajuda do cinema?
Comecei a utilizar o cinema em sala de aula no último ano do colegial, depois continuei numa sala de cinema. Foi uma experiência, iniciada em 2006, no cineclube MK2 da Biblioteca de Paris. O sucesso foi imediato e me permitiu realizar quatro séries de conferências. Não se trata simplesmente de ensinar filosofia por meio do cinema, mas de confrontar cinema e filosofia. Muitas vezes, é o cinema que nos esclarece sobre a filosofia, graças ao seu poder de identificação.
Por que escolheu trabalhar com a filosofia de Descartes e Spinoza?
Comecei por Descartes e Spinoza, pois ambos buscaram um meio de universalizar seu pensamento ao lhe conferir uma forma democrática. Democrática não quer dizer fácil, mas acessível. Descartes escreveu em francês em vez de usar o latim. E Spinoza escreveu à maneira dos geômetras, more geometrico. Escolhi-os também porque Descartes e Spinoza utilizam a metáfora do olho e da visão para falar da atividade do espírito. Descartes fala de intuição, de ideia clara e distinta, da luz da razão... Spinoza diz, acerca das demonstrações, que elas são “os olhos da alma”. Eu quis “ver” se essa metáfora devia ser levada a sério e se podia ser fecunda, por exemplo, para compreender os movimentos de câmera no cinema. Não se pode dizer que Descartes privilegie a razão e Spinoza, a emoção. Spinoza é tão racionalista quanto Descartes. O que é interessante é que Descartes é um filósofo da liberdade, ao passo que Spinoza é um filósofo da necessidade. Quis explorar essa dissonância e dar-lhe vida através do cinema.
Por outro lado, esse livro é a primeira etapa de um projeto mais amplo, uma vez que há quatro anos venho trabalhando igualmente com Hegel, Kant, Rousseau, Alain, Michel Foucault, René Girard, Michel Serres... e sobre temas como a representação das catástrofes, a manipulação na democracia, a saúde, a criação nas ciências e na arte...
Como os filmes são usados no ensino de filosofia? Cada um é associado a um conceito distinto? O senhor poderia dar um exemplo?
Em Colateral, de Michael Mann, Tom Cruise personifica um matador profissional. Há uma cena numa boate em que cada movimento de câmera corresponde a um preceito do método cartesiano: ideia clara e distinta (do desfocado à definição), divisão da dificuldade (zoom), invenção de uma ordem não natural (montagem), enumeração (panorâmica). É delicado resumir, ainda mais sem estar assistindo ao filme, e eis por que no livro proponho uma montagem de trechos de filmes com descrições e diálogos, numa ordem que permite construir a ideia.
Ao som de: Man in the Box - Alice in Chains

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Entre Deus e o Diabo




Propício para questionarmos a perfeição, colocarmos na balança os modelos de vida e os valores contemporâneos da pós-modernidade. Será essa perfeição tão perfeita assim? Teremos mesmo, nós humanos, que almejar construir uma vida perfeita? Casinha simples, um cachorro, piano com flores e margarina sem sal de manhã? Isso não seria almejar parecer ter uma vida perfeita aos olhos alheios? O que realmente importa? O que mais importa?


"Como Deus é piedoso, dele aprendo a humildade, como o Diabo é infeliz, dele aprendo a vaidade. Ambos são improváveis, por isso merecem nossa fé."

Texto de Luiz Felipe Pondé, na Folha dia 31/08/09.

"O habitat natural da alma é viver entre Deus e o Diabo. Sem esse combate, a alma se dissolve em pequenas manias diárias e fica pequena.
Uma das faces da miséria humana é a vaidade, e a vaidade quer agradar. Como diz a escritora portuguesa Agustina Bessa-Luís, hoje todo mundo quer agradar, o professor, o artista, o metafísico. Sua tese é que no fundo deste desejo de agradar está o trauma infantil do desamparo que nos afeta a todos. Ao tentar agradar, buscamos fugir do medo do desamparo. Quando o intelectual é afetado por este desejo, ele se transforma numa máquina de repetição de unanimidades a fim de agradar a opinião pública.
Também morro de medo, como não? Ainda mais hoje, quando agradar é um conceito cientifico na sociedade de mercado. Quando atingida pela unanimidade, a opinião pública torna o ar irrespirável. Segundo a ciência da opinião pública, discordar dela é suicídio.
A partir de sua pequena janela, em seu pequeno apartamento de classe média, onde a televisão reproduz um desses programas alegres de domingo, nossa heroína, a opinião pública, contempla sua criação. Com uma lupa, vasculha o mundo, em busca de um vírus que justifique cientificamente seu medo.
Até o Diabo fica pálido diante dessa moradora de apartamento de classe média, que vasculha o mundo com sua lupa. O Diabo se esconde, sentindo-se finalmente derrotado, com as faces vermelhas de pudor.
Há medos e medos. Há medos que nos engrandecem e medos que nos humilham. O medo de Hamlet nos engrandece: afinal, seria eu, no fundo, uma caveira vazia? Ou seria eu uma alma cega, que, mesmo sendo, no fundo, uma caveira vazia, pressente a presença de seu criador e o persegue arrastando-se pelo chão?
O medo de quem grita nas farmácias em busca de álcool gel nos humilha. Os olhos de um chimpanzé dentro de sua cela no zoológico são mais humanos do que a obsessão de quem lava as mãos a cada segundo.
Tanto o professor, quanto o artista, o metafísico, são obrigados a seguir o roteiro da concepção de vida medíocre da classe média em que só pode ser dito o que "agrega valor à vida". Cuidado! Os olhos da moradora do apartamento enxergam tudo o que se move em sua criação. E nela, todos devem ter seus orçamentos equilibrados.
O professor deve ver diante de si alguém que, por definição, nunca erra, e se preocupar com sua autoestima, o artista deve pintar o rosto do pequeno deus miserável que sonhamos ter dentro de nós, o metafísico, este coitado, vira escravo de um universo que deve estar a nossa disposição a cada segundo resolvendo até nossos crediários.
Confesso: eu não tenho uma concepção de vida, sou um coitado. Vejo a vida como Pepi, a faxineira do romance de Kafka "O Castelo". Pelo buraco de uma fechadura, vejo a vida e seus muitos vultos aos pedaços, arrastando-se pelas paredes. A duras penas pressinto suas formas. Muitas vezes estremeço quando as pressinto mais agudamente.
Já tentei ter uma concepção de vida, mas desisti e hoje, como diz o filósofo romeno Cioran (século 20), eu acho que grande parte dos problemas do mundo advém da praga que é todo mundo querer ter uma concepção de vida. Quando estou diante de alguém que tem uma concepção de vida, recuo assim como quem recua de um predador. A certeza acerca do que seja uma vida plena me apavora. Antigamente apenas alguns poucos eram tomados por esta febre, mas hoje, como vivemos no mundo das grandes quantidades, todos se acham no direito de ter concepções de vida.
A indiferença faria do mundo, talvez, um lugar melhor. Mas sei que isso é difícil de ser compreendido por quem se vê como um agente do bem, a partir de seu pequeno apartamento de classe média, ao som de seu programa alegre de domingo. Quem assim se vê normalmente não tem qualquer piedade.
Nessas horas, sinto saudades de Deus e daquele tipo de santo que vivia o dilaceramento de quem se vê tragado, de um lado, pela graça de Deus, e, do outro, por sua natureza orgulhosa, que se revolta contra os elementos naturais, apenas porque eles lhe são indiferentes.
Há uma luta entre Deus e o Diabo e seu palco é o coração humano, nos diz Dimitri Karamazov, um dos heróis de Dostoiévski. O habitat natural da alma é viver entre Deus e o Diabo. Como Deus é piedoso, dele aprendo a humildade, como o Diabo é infeliz, dele aprendo a vaidade. Ambos são improváveis, por isso merecem nossa fé."


Ao som de - Hino Nacional Brasileiro - Vanusa

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Ritos corporais entre os Nacirema




O antropólogo está tão familiarizado com a diversidade das formas de comportamento que diferentes povos apresentam em situações semelhantes, que é incapaz de surpreender-se mesmo em face dos costumes mais exóticos. De fato, se nem todas as as combinações logicamente possíveis de comportamento foram ainda descobertas, o antropólogo bem pode conjecturar que elas devam existir em alguma tribo ainda não descrita.

Deste ponto de vista, as crenças e práticas mágicas dos Nacirema apresentam aspectos tão inusitados que parece apropriado descrevê-los como exemplo dos extremos a que pode chegar o comportamento humano. Foi o Professor Linton, em 1936, o primeiro a chamar a atenção dos antropólogos para os rituais dos Nacirema, mas a cultura desse povo permanece insuficientemente compreendida ainda hoje.

Trata-se de um grupo norte-americano que vive no território entre os Cree do Canadá, os Yaqui e os Tarahumare do México, e os Carib e Arawak das Antilhas. Pouco se sabe sobre sua origem, embora a tradição relate que vieram do leste. Conforme a mitologia dos Nacirema, um herói cultural, Notgnihsaw, deu origem à sua nação; ele é, por outro lado, conhecido por duas façanhas de força: ter atirado um colar de conchas, usado pelos Nacirema como dinheiro, através do rio Po- To- Mac e ter derrubado uma cerejeira na qual residiria o Espírito da Verdade.
A cultura Nacirema caracteriza-se por uma economia de mercado altamente desenvolvida, que evolui em um rico habitat. Apesar do povo dedicar muito do seu tempo às atividades econômicas, uma grande parte dos frutos deste trabalho e uma considerável porção do dia são dispensados em atividades rituais. O foco destas atividades é o corpo humano, cuja aparência e saúde surgem como o interesse dominante no ethos deste povo. Embora tal tipo de interesse não seja, por certo, raro, seus aspectos cerimoniais e a filosofia a eles associadas são singulares.

A crença fundamental subjacente a todo o sistema parece ser a de que o corpo humano é repugnante e que sua tendência natural é para a debilidade e a doença. Encarcerado em tal corpo, a única esperança do homem é desviar estas características através do uso das poderosas influências do ritual e do cerimonial. Cada moradia tem um ou mais santuários devotados a este propósito. Os indivíduos mais poderosos desta sociedade têm muitos santuários em suas casas e, de fato, a alusão à opulência de uma casa, muito freqüentemente, é feita em termos do número de tais centros rituais que possua. Muitas casas são construções de madeira, toscamente pintadas, mas as câmeras de culto das mais ricas têm paredes de pedra. As famílias mais pobres imitam as ricas, aplicando placas de cerâmica às paredes de seu santuário.

O ritual do corpo executado diariamente por cada Nacirema inclui um rito bucal. Apesar de serem tão escrupulosos no cuidado bucal, este rito envolve uma prática que choca o estrangeiro não iniciado, que só pode considerá-lo revoltante. Foi-me relatado que o ritual consiste na inserção de um pequeno feixe de cerdas de porco na boca juntamente com certos pós mágicos, e em movimentá-lo então numa série de gestos altamente formalizados. Além do ritual bucal privado, as pessoas procuram o sacerdote-da-boca uma ou duas vezes ao ano. Estes profissionais têm uma impressionante coleção de instrumentos, consistindo de brocas, furadores, sondas e aguilhões. O uso destes objetos no exorcismo dos demônios bucais envolve, para o cliente, uma tortura ritual quase inacreditável. O sacerdote-da-boca abre a boca do cliente e, usando os instrumentos acima citados, alarga todas as cavidades que a degeneração possa ter produzido nos dentes. Nestas cavidades são colocadas substâncias mágicas. Caso não existam cavidades naturais nos dentes, grandes seções de um ou mais dentes são extirpadas para que a substância natural possa ser aplicada. Do ponto de vista do cliente, o propósito destas aplicações é tolher a degeneração e atrair amigos. O caráter extremamente sagrado e tradicional do rito evidencia-se pelo fato de os nativos voltarem ao sacerdote-da-boca ano após ano, não obstante o fato de seus dentes continuarem a degenerar.

Esperemos que quando for realizado um estudo completo dos Nacirema haja um inquérito cuidadoso sobre a estrutura da personalidade destas pessoas, Basta observar o fulgor nos olhos de um sacerdote-da- boca, quando ele enfia um furador num nervo exposto, para se suspeitar que este rito envolve certa dose de sadismo. Se isto puder ser provado, teremos um modelo muito interessante, pois a maioria da população demonstra tendências masoquistas bem definidas.

Foi a estas tendências que o Prof. Linton (1936) se referiu na discussão de uma parte específica dos ritos corporal que é desempenhada apenas por homens. Esta parte do rito envolve raspar e lacerar a superfície da face com um instrumento afiado. Ritos especificamente femininos têm lugar apenas quatro vezes durante cada mês lunar, mas o que lhes falta em freqüência é compensado em barbaridade. Como parte desta cerimônia, as mulheres usam colocar suas cabeças em pequenos fornos por cerca de uma hora. O aspecto teoricamente interessante é que um povo que parece ser preponderantemente masoquista tenha desenvolvido especialistas sádicos.

Os médicos-feiticeiros têm um templo imponente, ou latipsoh, em cada comunidade de certo porte. As cerimônias mais elaboradas, necessárias para tratar de pacientes muito doentes, só podem ser executadas neste templo. Estas cerimônias envolvem não apenas o taumaturgo, mas um grupo permanente de vestais que, com roupas e toucados específicos, movimentam-se serenamente pelas câmaras do templo.

As cerimonias latipsoh são tão cruéis que é de surpreender que uma boa proporção de nativos realmente doentes que entram no templo se recuperem. Sabe-se que as crianças pequenas, cuja doutrinação ainda é incompleta, resistem às tentativas de levá-las ao templo, porque "é lá que se vai para morrer". Apesar disto, adultos doentes não apenas querem, mas anseiam por sofrer os prolongados rituais de purificação, quando possuem recursos para tanto. Não importa quão doente esteja o suplicante ou quão grave seja a emergência, os guardiões de muitos templos não admitirão um cliente se ele não puder dar uma dádiva valiosa para a administração. Mesmo depois de ter-se conseguido a admissão, e sobrevivido às cerimônias, os guardiães não permitirão ao neófito abandonar o local se ele não fizer outra doação.

O suplicante que entra no templo é primeiramente despido de todas as suas roupas. Na vida cotidiana o Nacirema evita a exposição de seu corpo e de suas funções naturais. As atividades excretoras e o banho, enquanto parte dos ritos corporais, são realizados apenas no segredo do santuário doméstico. Da perda súbita do segredo do corpo quando da entrada no latipsoh, podem resultar traumas psicológicos. Um homem, cuja própria esposa nunca o viu em um ato excretor, acha-se subitamente nu e auxiliado por uma vestal, enquanto executa suas funções naturais num recipiente sagrado. Este tipo de tratamento cerimonial é necessário porque os excreta são usados por um adivinho para averiguar o curso e a natureza da enfermidade do cliente. Clientes do sexo feminino, por sua vez, têm seus corpos nus submetidos ao escrutínio, manipulação e aguilhadas dos médicos-feiticeiros.

Resta ainda um outro tipo de profissional, conhecido como um "ouvinte". Este "doutor-bruxo" tem o poder de exorcizar os demônios que se alojam nas cabeças das pessoas enfeitiçadas. Os Nacirema acreditam que os pais enfeitiçam seus próprios filhos; particularmente, teme-se que as mães lancem uma maldição sobre as crianças enquanto lhes ensinam os ritos corporais secretos. A contra-magia do doutor bruxo é inusitada por sua carência de ritual. O paciente simplesmente conta ao "ouvinte" todos os seus problemas e temores, principalmente pelas dificuldades iniciais que consegue rememorar. A memória demonstrada pelos Nacirema nestas sessões de exorcismo é verdadeiramente notável. Não é incomum um paciente deplorar a rejeição que sentiu, quando bebê, ao ser desmamado, e uns poucos indivíduos reportam a origem de seus problemas aos feitos traumáticos de seu próprio nascimento.

Como conclusão, deve-se fazer referência a certas práticas que têm suas bases na estética nativa, mas que decorrem da aversão profunda ao corpo natural e suas funções. Existem jejuns rituais para tornar magras pessoas gordas, e banquetes cerimoniais para tornar gordas pessoas magras. Outros ritos são usados para tornar maiores os seios das mulheres que os têm pequenos e torná-los menores quando são grandes. A insatisfação geral com o tamanho do seio é simbolizada no fato de a forma ideal estar virtualmente além da escala de variação humana. Umas poucas mulheres, dotadas de um desenvolvimento hipermamário quase inumano, são tão idolatradas que podem levar uma boa vida simplesmente indo de cidade em cidade e permitindo aos embasbacados nativos, em troca de uma taxa, contemplarem-nos.

Já fizemos referência ao fato de que as funções excretoras são ritualizadas, rotinizadas e relegadas ao segredo. As funções naturais de reprodução são, da mesma forma, distorcidas. O intercurso sexual é tabu enquanto assunto, e é programado enquanto ato. São feitos esforços para evitar a gravidez, pelo uso de substâncias mágicas ou pela limitação do intercurso sexual a certas fases da lua. A concepção é na realidade, pouco freqüente. Quando grávidas as mulheres vestem-se de modo a esconder o estado. O parto tem lugar em segredo, sem amigos ou parentes para ajudar, e a maioria das mulheres não amamenta seus rebentos.

Nossa análise da vida ritual dos Nacirema certamente demonstrou ser este povo dominado pela crença na magia. É difícil compreender como tal povo conseguiu sobreviver por tão longo tempo sob a carga que impôs sobre si mesmo. Mas até costumes tão exóticos quanto estes aqui descritos ganham seu real significado quando são encarados sob o ângulo relevado por Malinowski, quando escreveu:
"Olhando de longe e de cima de nossos altos postos de segurança na civilização desenvolvida, é fácil perceber toda a crueza e irrelevância da magia. Mas sem seu poder de orientação, o homem primitivo não poderia ter dominado, como o fêz, suas dificuldades práticas, nem poderia ter avançado aos estágios mais altos da civilização"

(nota: para quem não percebeu, Nacirema é American, de trás para a frente)

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Conhecer Melhor

Depois de velho eu quero pensar a minha vida. Fazer uma reflexão filosófica e racional acerca da minha caminhada nessa existência. Afinal o que é melhor de se conhecer do que eu mesmo? Não vou estudar um chinês ou um alemão, eu serei o objeto do meu estudo. Uma espécie de círculo de conhecimento, eu em mim mesmo. E o que é mais útil de conhecer do que eu mesmo?
Através de uma crítica da minha caminhada poderei me conhecer melhor, descobrir aquilo que eu sou, aquilo que eu posso ser, e assim agir para que possa me tornar aquilo que realmente sou, conhecendo-me a mim mesmo. Atingir plenamente a minha essência.
Existe algo mais importante que isso? Algo mais importante do que saber quem sou? Pra que estudar estética, política se não se sabe nada sobre o sujeito que está compreendendo isso. Será como jogar farinha num saco furado, derrubando-a no vazio, em lugar algum. A necessidade é a de se conhecer o anthropos (homem na origem de sua palavra, em grego) próprio, reconhecer a ação dialética, na qual o homem age no mundo e o mundo age no homem. Descubra qual é esse homem que age no mundo, que muda o mundo, para descobrir o que se pode fazer com esse mundo, para se ter o mundo nas mãos. Conhece-te a ti mesmo e tenha o mundo em suas mãos.
Simples? Nem um pouco. Mas pensando bem para que deixar para fazer isso depois de velho...

terça-feira, 25 de agosto de 2009

As profissões do cinema: o papel de cada um



Olá!
Estou dando inicio a um projeto de cinema e filosofia. Portanto resolvi como primeiro passo esclarecer um pouco sobre o papel de cada profissional no decorrer de uma produção cinematográfica. O cinema, além de absorver profissionais de vários campos da arte e tecnologia, criou algumas funções específicas que só existem dentro do próprio cinema. Conhecer algumas das principais funções é importante para entendermos melhor alguns artigos e críticas e para nós que desejamos ver o cinema não só como um meio de subjetivação e expressão emotiva mas como uma obra de arte que requer cuidadosa elaboração e como um documento histórico e social que reflete ideologias, opiniões e momentos históricos.

O que faz um...

Diretor
O diretor teve diferentes funções ao longo da história do cinema, mas quase sempre está ligado à autoria do filme, com a respeitável exceção do período dos grandes estúdios no cinema norte-americano, quando diretores eram contratados e demitidos, antes mesmo de terminar o filme, pelo produtor. o diretor é quem responde pela concepção artística do filme, coordenando a dramaturgia e a estética visual e sonora do trabalho. Escolhe e ensaia atores, define planos, participa da montagem, dá os parâmetros da arte, da trilha sonora..Ele está presente na concepção e na supervisão de todas as etapas da produção de um filme.


Roteirista
O roteiro pode ser chamado de matéria-prima de um filme. É a partir dele que o diretor vai conceber a obra, assim como serve para orientar a produção em todas as suas tarefas. Por isso o roteirista é um profissional que deve dominar muito bem a arte da escrita, da dramaturgia, e também possuir conhecimentos cinematográficos, que façam com que seu texto tenha indicações visuais.


Produtor executivo
O produtor executivo pode ser considerado, a grosso modo, como quem cuida do cinema como indústria e comércio. É o produtor quem viabiliza financeiramente a obra, tratando desde o financiamento até a exibição do filme. É ele quem define o orçamento, as contratações e a logística de todo o trabalho.


Diretor de produção
A implementação e a condução no dia-a-dia dessas definições ficam a cargo do diretor de produção, que faz com que todos os planos de realização aconteçam no prazo certo e com os custos sob controle.


Diretor de fotografia
É quem, amparado pelas ideias do diretor, cria a iluminação do filme, além de propor os enquadramentos e os movimentos de câmera. Pode-se dizer qe ele é um dos maiores responsáveis pelo que se chama de atmosfera do filme, ajudando a definir o estilo da obra.

Diretor de arte
É o responsável pelo visual do filme, dando os parâmetros e participando da definição de figurinos, maquiagem, escolha de locações, decoração dos ambientes e da criação dos cenários.

Montador
Depois de filmadas as cenas, é o montador quem vai ordená-las em um processo chamado de montagem ou edição. Ele escolhe os melhores planos e o tempo de duração de cada um, para que a narrativa do filme fique coerente com o que o roteiro propôs e o diretor realizou.

Editor de áudio
Monta e edita a parte sonora dos filmes. Além de montar os diálogos, cria e insere os ruídos pertinentes.


Leitura complementar:
Caderno de cinema do professor - dois.
ANDREW, J. As principais teorias do cinema.
AUMONT, J. Dicionário teórico e crítico de cinema.
BERGAN, Ronald. Cinema - guia ilustrado Zahar.

Ao som de: U2 - Magnificent

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Os fantasmas da perfeição

Vivemos em tempos de crise. A humanidade é uma espécie, como todas, adaptada a um meio ambiente quase sempre hostil: sofrimentos, violência, morte. Habitamos, entretanto, um tipo de meio ambiente distinto das demais espécies: o espaço interior, a alma, a mente, o espírito. Vivemos expectativas, fracassos, inquietações, e a consciência da dor. Os últimos séculos estabeleceram formas novas desses velhos dramas: sonhos políticos, técnicos, científicos, psicológicos e morais, todos marcados pela tentativa de interromper um destino infeliz aparentemente inexorável. Por isso, a crise atual tem marcas específicas: uma delas é sua relação direta com os processos utópicos modernos.

Quando falamos em utopias pensamos imediatamente nos grandes modelos políticos criados a partir da obra de Jean Jacques Rousseau (século 18): revolução social, política e econômica. Todavia, a ideia de utopia é mais antiga e remonta aos renascentistas e à filosofia humanista: o homem é dono de sua vida e pode fazer com ela o que quiser. O sonho da vida perfeita, desde então, virou um fantasma: para chegar à felicidade, basta descobrir as fórmulas. Será? Pode o homem tornar-se perfeito? Tem ele a capacidade de construir um projeto perfeito de futuro? Sua natureza detém os recursos necessários para realizar este projeto? Pode o homem tornar-se pleno? Neste cenário, a modernidade tornou-se o grande produto dos processos utópicos: economia científica, políticas da liberdade e da justiça social, autonomia dos sujeitos.

Normalmente identificamos a “morte das utopias” como a queda do muro de Berlim em 1989: a morte da justiça social plena. Em 2008, outra imagem surgirá no cenário mundial como exemplo de “morte das utopias”: a crise da sociedade baseada no consumo e no mercado como fim de uma história que teria encontrado seu modelo último de aperfeiçoamento no capitalismo pleno.

Mas as utopias só não construíram fantasmas coletivos. Outros fantasmas, com nomes próprios, vieram à noite visitar os sonhos e pesadelos dos indivíduos em suas pequenas vidas comuns. E o que faz o indivíduo sozinho, à noite, no seu quarto, diante desses fantasmas? Para além dos grandes processos políticos e sociais, o que significou, em nosso cotidiano, vivermos sob a tutela de um projeto de perfeição? Como cada um de nós, na solidão da vida e de suas pequenas decisões que formam a malha quase invisível em que respiramos, viveu esta obsessão pela vida perfeita? Utopias da personalidade, da sexualidade, do amor, da liberdade, do conhecimento, varreram nossas vidas. Talvez a cura passe pelo enfrentamento da imperfeição e do conflito como universo último da vida. Seríamos, afinal, uma pequena alma que sabe mais do que deve, mas nunca tudo o que precisa? Enfim, teríamos diante de nós o risco de sermos um ser sem sentido último e sem certezas? Seria esta uma forma mais livre de viver? A imperfeição como horizonte?

Texto sobre palestra de Luís Felipe Pondé no Café Filosófico

Ao som de: Radiohead - 15 Step

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Não deixe o encanto desaparecer. A última tirinha de Calvin.



Infelizmente isso é o que acontece com a maioria de nós. E o mundo perde grande parte de seu brilho e de seu encanto. Triste.
Poderia escrever sobre milhões de coisas relacionadas a isso, mas prefiro que vocês ouçam os próprios pensamentos.
Fico por aqui.

Ao som de: Depeche Mode - A Question of Time

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Questões em sala

Olá!

Vamos às questões dadas em sala de aula na semana sobre o visto até agora: o princípio da filosofia e os pressocráticos (material completo sobre pressocráticos disponível em breve aqui no blog)

1) Defina o conhecimento adquirido por meio do senso comum.

2) Em que consiste o novo conceito de verdade criado pelos filósofos gregos?

3) Descreva em poucas linhas os pontos comuns e as diferenças entre mito e filosofia.

4) Dê as principais características da filosofia pressocrática.

5) Leia a citação de Parmênides e explique seu significado; compare-o com o pensamento de Heráclito.
“Necessário é dizer e pensar que só o ser é; pois o ser é, e o nada, ao contrário, nada é: afirmação que bem deves considerar”.
“Por outro lado, [o ser] imóvel nos limites de seus poderosos liames, é sem começo e sem fim; pois geração e destruição foram afastadas para longe, repudiadas pela verdadeira convicção. Permanecendo idêntico e em um mesmo estado, descansa em si próprio, sempre imutavelmente fixo e no mesmo lugar.”

E os testes:

1) Leia atentamente as proposições e assinale (V) para cada afirmação verdadeira e (F) para cada afirmação falsa:

( )Heráclito de Éfeso e Parmênides de Eleia foram dois dos mais importantes filósofos do chamado período pressocrático. Enquanto o primeiro compreendia a realidade como o fluxo ou devir permanente e eterno, o segundo compreendia a realidade como aquilo que permanece sempre idêntico a si mesmo e imutável
( )A tese sobre a realidade ou o Ser de Heráclito pode ser expressa, em síntese, da seguinte maneira:“O ser é (existe) e o não-ser não é (não existe)”. Já a tese de Parmênides de resumiria assim: “O não-ser é (existe)e o ser não é (não existe).
( )Como Heráclito e Parmênides pensavam apenas por metáforas (linguagem figurada), pode-se dizer que estavam muito mais próximos dos poetas, como Homero e Hesíodo, do que dos filósofos e da busca pela verdade.
( )Embora a concepção do Ser ou da realidade seja para Heráclito e Parmênides bastante distinta e até mesmo oposta, é necessário reconhecer que, tanto para um quanto para outro, os sentidos e o senso comum não alcançam o verdadeiro conhecimento, mas engendram apenas a opinião (doxa) Para ambos, apenas o pensamento (logos) pode conhecer a verdade

2) (UFU 2002)“Só resta o mito de uma via, a do ser; e sobre esta existem indícios de que sendo não gerado é também imperecível, pois é todo inteiro, inabalável e sem fim; nem jamais era nem será, pois é agora todo junto, uno, contínuo (…)”
A partir deste trecho do poema de Parmênides, é possível afirmar que:

( ) a continuidade, a geração e o imobilismo estão presentes na via do ser.
( ) o ser, por não poder não ser, não é gerado nem deixa de ser, não tendo princípio nem fim.
( ) a via do ser é aquela percebida pelos nossos sentidos.
( ) o ser, para o autor, de certo modo não é, pois nunca foi no passado nem será no futuro

3) (UFU 2003) “Só é possível pensar e dizer que o ente é, pois o ser é, mas o nada não é; sobre isso, eu te peço, reflita, pois esta via de inquérito é a primeira de que te afasto; depois afasta-te daquela outra, aquela em que erram os mortais desprovidos de saber e com dupla cabeça, pois, no peito, a hesitação dirige um pensamento errante: eles se deixam levar surdos e cegos, perplexos, multidão inepta, para quem ser e não ser é considerado o mesmo e não o mesmo, para quem todo o caminho volta sobre si mesmo”.
Sobre este trecho do poema de Parmênides, é correto afirmar que

I - só se pode pensar e dizer que o ser é.
II - para os mortais o ser é considerado diferente do não ser.
III - é possível dizer o não ser, embora não se possa pensá-lo.
IV - duas vias de inquérito devem ser afastadas: a do não ser e a dos mortais.

Assinale a alternativa que contém todas as afirmações corretas
( ) II e III
( ) II e IV
( ) I e III
( ) I e IV

4) (UFU-1998) - Heráclito de Éfeso afirmava que "ninguém pode banhar-se duas vezes nas mesmaságuas de um rio". Para ele, o que mantém o fluxo do movimento é:

a) a identidade do ser.
b) o simples aparecer de novos seres.
c) a harmonia que vem da calmaria dos elementos.
d) a estabilidade do ser.
e) a luta dos contrários, pois "a guerra é pai de todos, rei de todos”.

5) (UFU-1999) Parmênides de Eléia, filósofo pré-socrático, sustentava que:

I- o ser é.
II- o não-ser não é.
III- o ser e o não-ser existem ao mesmo tempo.
IV- o ser é pensável e o não-ser é impensável.

Assinale

a) se apenas I, III e IV estiverem corretas.
b) se apenas I, II e III estiverem corretas.
c) se apenas II, III e IV estiverem corretas.
d) se apenas I, II e IV estiverem corretas.
e) se todas as afirmativas estiverem corretas.

sexta-feira, 27 de março de 2009

Texto para a avaliação de Filosofia 2

Segue o segundo texto utilizado para a avaliação de Filosofia do mês de Março para o Ensino Médio:

“Um dos grandes filósofos gregos, que viveu há mais de dois mil anos, acreditava que a filosofia era fruto da capacidade do homem de se admirar com as coisas. Ele achava que para o homem a vida é algo tão singular que as perguntas filosóficas surgem como que espontaneamente. É como o que ocorre quando assistimos a um truque de mágica: não conseguimos entender como é possível acontecer aquilo que estamos vendo diante de nossos olhos. E então, depois de assistirmos à apresentação, nos perguntamos: como é que o mágico conseguiu transformar lenços de seda brancos num coelhinho vivo?
Para muitas pessoas, o mundo é tão incompreensível quanto o coelhinho que um mágico tira de uma cartola que, há poucos instantes, estava vazia(...)
A única diferença entre nós e o coelhinho branco é que o coelhinho não sabe que está participando de um truque de mágica. Conosco é diferente. Sabemos que estamos fazendo parte de algo misterioso e gostaríamos de poder explicar como tudo funciona.”

GAARDER, Jostein. O mundo de Sofia. São Paulo: Cia das letras, 2005. Pp. 24-26.

Com conhecimento do conteúdo apresentado em aula, e tendo como base os textos apresentados, desenvolva uma dissertação sobre a filosofia nos dias de hoje: tente abordar sua necessidade, seu papel, sua função, seu nascimento e futuro.
Lembre-se que serão analisados, além de elementos gramaticais, a coerência, a coesão, capacidade de expor idéias (raciocínio e argumentação) e conhecimento dos conteúdos vistos nas aulas.
Mínimo de 20 linhas.
Boa Prova!
Prof. Thiago Minnemann



Ao som de: Chico Buarque - Palavra de mulher (ao vivo)

Texto para avaliação de Filosofia

Oi!
Segue o primeiro texto utilizado para a avaliação de Filosofia do mês de Março para o Ensino Médio:

“Por que já não é hoje amada a filosofia? Por que suas filhas, as ciências, depois de repartirem entre si a herança, lhe voltam as costas, como as filhas do rei Lear depois de dividido o reino?
Tempo houve em que por ela morriam os homens mais fortes: Sócrates preferiu ser um dos seus mártires a viver em luta contra seus inimigos; por duas vezes Platão quase lhe conquistou um reino; Marco Aurélio amou-a mais que ao trono; e Bruno deixou-se queimar na figueira só para não traí-la. Tempo houve em que reis e papas a temiam, e encarceravam os filósofos com medo que eles lhes destruíssem as dinastias. Atenas exilou Pretágoras; Alexandria tremeu diante de Hipatia; um grande papa cortejou humildemente a amizade de Erasmo; regentes e reis disputavam a presença de Voltaire, e roeram-se de ciúmes quando o mundo inteiro se curvou ao centro daquela pena; Dionisio e seu filho ofereceram a Platão o governo de Siracusa; a ajuda de Alexandre fez de Aristóteles o homem mais culto que a história conhece; um rei erudito levou Bacon à liderança da Inglaterra e protegeu-o contra os inimigos; e Frederico o grande, à meia-noite, quando seus pomposos generais iam para a cama, chamava sua hoste de poetas e filósofos para orgias espirituais.
Grandes momentos foram esses para a Filosofia, quando ela monopolizava todas as províncias do saber humano e se punha à frente de todos os movimentos. Os homens honravam-na; nada era tido em conta mais alta que o amor à verdade. Alexandre só via a si próprio acima de Diogenes, e Diogenes pediu-lhe que se afastasse para lhe não tirar, com a interposição de sua real carcassa, o que lhe não poderia dar, o sol. Estadistas, pensadores e artistas enxameavam em torno de Aspasia, e dez mil estudantes vieram em peregrinação a Paris para conhecer Abelardo. A filosofia não era então nenhuma timorata solteirona a esconder-se em torres de marfim, de medo do mundo: seus olhos brilhantes não se arreceavam da luz do sol; vivia perigosamente, fazia longas viagens por mares ignotos. Poderia ela, no tempo áureo em que mantinha corte junto à dos monarcas, contentar-se com a clausura em que vive hoje? Era, naquele tempo, a irisada luz que vinha quente das almas profundas; hoje não passa de humilde satélite de ciências fragmentárias. Foi a orgulhosa senhora do mundo intelectual, com servidores tomados do mais alto; hoje, despida de beleza e poder, vive à margem, sem reverencia de ninguém.
A filosofia já não é mais amada porque perdeu o espírito de aventura. O súbito erguer-se das ciências roubou-lhe um a um os antigos domínios. A “Cosmologia” fez-se astronomia e geologia; a “filosofia natural” tornou-se biologia e física; e até a “filosofia do espírito” passou a psicologia. Todos os grandes problemas que ela tentava resolver foram-lhe arrancados: a natureza da matéria, o mistério da vida e do crescimento; a “vontade”, cuja “liberdade” ela debateu em cem guerras do pensamento, foi triturada no mecanismo da vida moderna; o estado, cujos problemas lhe pertenciam, virou presa de almas pequeninas que pedem cada vez menos conselhos dos filósofos. Nada lhe ficou, exceto os nevados topos da metafísica, os pueris enigmas da epistemologia e as acadêmicas disputas sobre uma moral que já perdeu toda a influência sobre a humanidade. E mesmo estes territórios ainda lhe serão arrancados. Novas ciências surgirão, que os invadirão e os conquistarão, armadas de microscópios e bussolas.
E talvez até o mundo ainda venha a esquecer-se de que a filosofia existiu e foi a grande coisa – a motora dos corações, a criadora do espírito.”

DURANT, Will. A filosofia da vida.


Ao som de: Chico Buarque - Eu te amo (ao vivo)

quinta-feira, 26 de março de 2009

A noção de Filosofia











Olá a todos!

Neste post farei uma breve explanação sobre a noção de filosofia e uma mais breve ainda sobre os diversos tipos de conhecimento.

A pergunta que não quer calar, enfrentada por não filósofos, filósofos, professores universitários, todos: "O que é filosofia?".
Complicadíssimo responder, mas pode-se dizer que o filosofar é uma atividade reflexiva que visa o sentido que o ser humano dá a seu existir, ao mundo em que vive e às diversas dimensões do conhecimento (científico, senso comum, mítico, por exemplo) e da ação (interações sociais e ação política).

A própria palavra "filosofar" adquire diversos significados que, por diversas vezes, se entremeiam.
Então podemos, em primeiro lugar - por ser mais comum - falar da Filosofia como sinônimo do simples pensar: é o pensamento cotidiano, aquele amigo que, numa situação qualquer da uma "viajada" e alguém fala: "pô, esse cara ta filosofando", mesmo que ele não fale absolutamente nada de filosofia ou só fale bobagens. Todos conhecemos, todos temos um. E é tal tipo de coisa que contribui para uma visão errônea do filósofo, em que ele está sempre "viajando", alheio ao mundo, como nesse vídeo do grupo de comédia inglês, Monthy Python:

O Futebol dos Filósofos


O segundo é o filosofar como sinônimo de saber viver. É a filosofia que deriva de Sócrates e da temática centrada no homem e no bem viver, é ligada à ética e à busca pelo modo virtuoso de viver (até certo momento da filosofia), em que o modo de vida deve manifestar as melhores características do homem. "Conhece-te a ti mesmo".

O terceiro é como Filosofia, como profissão propriamente dita: o trabalho do filósofo, de pesquisa, leitura, muita leitura. Nesse sentido o filósofo conhece a história da filosofia e trabalha em cima dela esclarecendo conceitos, realizando pesquisas, desenvolvendo teses e escrevendo - muito. É a filosofia como vista depois de Kant, que, investigando os limites da razão pura, acabou por compartimentar a filosofia, definir até onde se estende os campos de tal disciplina guiada pela simples razão. Portanto, até a época moderna, a filosofia e as outras disciplinas não se distinguiam, e foram se desligando parcialmente, até se formar como a entendemos hoje.

O mérito da filosofia está em esta ser racional, crítica e investigativa, diferente dos mitos, do senso comum e das religiões.

O conhecimento humano se distingue em diversos tipos de acordo com o interesse, objeto, método e características próprias. O conhecimento filosófico, como ja dito, visa dar sentido às coisas e é estritamente racional (por definição, pois acredito cada vez mais que o conhecimento filosófico está ligado, junto com a razão, à boas doses de sensações e sentimentos). O conhecimento mítico é anterior ao filosófico e seu ponto de contato com a filosofia é o objetivo: explicar o mundo, dar sentido às coisas, atender ao chamado básico e necessário da admiração. Porém, os mitos não se pautam na razão mas sim em crenças, na imaginação e na cultura. Não é tão simples assim falar sobre os mitos, muito já foi e ainda é escrito sobre estes: seu papel nas sociedades, seus significados e sua importância para a humanidade - inclusive para os dias de hoje. É importante ressaltar que ambos são subjetivos, ou seja, variam de pessoa para pessoa, de cultura para cultura, crença a crença, de modo que uma corrente filosófica não é universal. Um dos papéis do filósofo é denunciar os mitos que impedem a visão da verdade racional. "Filosofar é ver o relâmpago como fenômeno natural e não como vingança ou ameaça divina" é dito frequentemente.

O conhecimento científico, ao contrário, tem como mérito principal ser objetivo: a água ferve a 100°c a um atm, seja aqui ou na Polinésia Francesa. Um mesmo experimento científico há de resultar numa mesma cena em qualquer lugar do mundo, desde que o método exato seja seguido. Aqui outra característica crucial do conhecimento científico: este segue um método, que pode ser resumido em problematização, hipótese, investigação, tese e sua aplicação resultante. O maior mérito do conhecimento científico contemporâneo é o fato de ele ser falseável: cada teoria deve estar aberta a, um dia, ser falseada, de modo que nenhuma teoria científica é definitiva - seria, pois, um dogma - nem explica a totalidade do real, sendo sempre transitório o conhecimento científico. É possível, realmente, que se entre em crise e desespero ao pensar num primeiro momento que todo nosso conhecimento científico - tido sempre como infalível e seguro - não passa de um modo adequado às nossas necessidades e capacidades de explicar o mundo, portanto frágil, delicado e mutável. Mas é exatamente isso, basta fazer uma retrospectiva histórica da cosmologia, de Aristóteles à Einstein. Mesmo com toda essa aparente fraqueza, vejam tudo o que construímos e alcançamos ("a troco de quê?" Fica lançada a questão).

Há, por último, o senso comum. Conhecimento comum. Aquele mais imediato que tende a resolver nossos problemas mais urgentes e deriva da aurora da civilização humana, sendo portanto, a forma mais antiga e primária de conhecer o mundo. O senso comum, nem sempre é racional, se baseia em crenças, em valores, em costumes. Não é criticamente refletido, sendo, ao longo do tempo, incorporado à cultura e ao costume, se incrustando, de geração à geração, na mente e sendo entendido como normal e padrão. Pode parecer um conhecimento pejorativo, mas basta lembrar que é no seio do senso comum que se desenvolveram as sociedades: toda cultura reside no senso comum e no bom senso, não fosse ela, possivelmente nada haveria.

Fico por aqui, com uma frase atribuída a Aristóteles que diz que "se se deve filosofar, deve-se filosofar e, se não se deve filosofar, deve-se filosofar; de todos os modos, portanto, se deve filosofar".

Abraços, até mais.

Ao som de: Dream Theater - Beyond this life.